quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Praia da Estação - 23/01/2010

Ei Lacerda, seu decreto é uma merda!



















































quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

O Decreto da praça da Estação


Segue artigo publicado no Site Dias sem Compras, um artigo do Cidade Situada sobre a questão da proibição de "eventos de qualquer natureza" na Praça da Estação, em Belo Horizonte.
http://diasemcompras.wordpress.com/2010/01/12/cidade-situada-informativo1/#comment-18

Sempre achei que a distopia narrada em "1984", de Orson Welles não estava muito longe da realidade. Este texto ressalta como as coisas passam de absurdas a normais, através de um trabalho muito “bem feito” de repressão por parte das elites. Expropriação do público, puro roubo do patrimônio humano, no sentido mais descarado do termo, uma praça! Vejam só, agora ela só serve de passagem.

Primeiro se proibiu que pessoas pudessem dormir na praça, através da “revitalização”. Agora não se pode mais permanecer na praça. Se eu me sentar com uns amigos pra tocar violão, por exemplo, e se aglomerarem algumas pessoas, isso seria um evento, de alguma natureza? Ah, prefeito, vá tomar no cu!

Segue o decreto:


DECRETO Nº 13.798 DE 09 DE DEZEMBRO DE 2009

O Prefeito de Belo Horizonte, no exercício de suas atribuições legais, em conformidade com o disposto no art. 31 da Lei Orgânica Municipal, considerando a dificuldade em limitar o número de pessoas e garantir a segurança pública decorrente da concentração e, ainda, a depredação do patrimônio público verificada em decorrência dos últimos eventos realizados na Praça da Estação, em Belo Horizonte,

DECRETA:

Art. 1º – Fica proibida a realização de eventos de qualquer natureza na Praça da Estação, nesta Capital.

Art. 2º – Este Decreto entra em vigor no dia 1º de janeiro de 2010.

Belo Horizonte, 09 de dezembro de 2009

Marcio Araujo de Lacerda

Prefeito de Belo Horizonte


Agora, o artigo:

A princípio, poderíamos entender esse documento, assinado diretamente pelo prefeito de Belo Horizonte, como evidência trivial de mais uma medida de rotina por parte da administração da cidade. No entanto, se nos esforçarmos um pouco mais e acompanharmos com atenção alguns dos processos que já se insinuam nessa metrópole – mas não somente nela –, poderemos desvendar elementos a mais que, normalmente, tendem a se esconder por trás do palavrório da política profissional, suas promessas que, não raro, se acasalam com os mitos ideais de uma sociedade que já se encontra em estágios supremos de mercantilização da vida.

Nesse mesmo final de ano em que foi publicado o famigerado Decreto, a prefeitura de BH, em comum acordo com grandes empreendedores e outros comparsas do circuito político, celebrou em altos tons seu sucesso na empreitada que buscou R$ 1 bilhão dos cofres da União, um dinheiro que não porta em si apenas sua simbologia monetária necessariamente mistificada, mas que também respalda uma complicada trama de projetos a serem deslanchados, para até 2014, ao longo de várias regiões da cidade.

2014 não são meros números conjugados, ou suporte cósmico para profecias entusiásticas. Em vários estados do Brasil, em muitas das grandes cidades fundadas nesse território ocupado há mais de cinco séculos por Estados ocidentalizados, pronuncia-se por um futuro que já estão se encarregando de antecipar, ou melhor, um futuro cujos processos arbitrários para sua consolidação se efetivam desde o presente. Várias cidades-destaque em solo brasileiro concentram esforços para sediar os mega-eventos da Copa do Mundo de 2014, o que significa a dedicação especial, desde esse ano de 2010, para acelerar as ações prévias urgentes para os jogos. 2010 é tido como momento marco para que as obras que pretendem preparar a infra-estrutura dessas cidades para os festejos da Copa possam, enfim, ser concluídas em tempo hábil.

Isso tudo já foi divulgado abertamente pelo ditos “oficiais”. Não são dados especiais, retirados de alguma caixa secreta resguardada a tranca e cadeado pelas hienas do governo ou das mega-empresas de turismo e de construção civil que tirarão suas fatias nessa remessa. Sim, são risadas das próprias hienas. O que surpreende é que a limpeza geral tenha como data inaugural justamente o primeiro dia do ano. Ora, poucos hão de discordar se afirmarmos que o momento mais “adequado” para esse tipo de coisa é quando os que têm a caneta em mãos decidem dar a canetada. O máximo que podemos fazer, diante de artimanhas normalmente tão distantes, é estar ao compasso de seus processos e ousar prever algumas obviedades, sem ter que, com isso, cair em invencionices mirabolantes. Pois coisas do tipo nunca acontecem “do nada”.

Em BH, pretende-se que em 2014 estejam encerrados os seguintes projetos: construção das vias 710 (da Avenida Bernardo Vasconcelos, nas proximidades do Minas Shopping, na região Nordeste, à Avenida dos Andradas, próximo à Avenida Itaituba, na zona Leste) e 210, ligando a Via do Minério, no Barreiro, à Avenida Tereza Cristina, no Betânia, Região Oeste. Além da ampliação do falacioso projeto Bulevar Arrudas – ou, para os mais íntimos, a tampa na cova de um velho rio morto pela Babilônia belo-horizontina.

Algo que chama a atenção é o simples fato de que, embora o arranjo de seu território urbano, para abrigar os lucrativos festejos da Copa, ocupe o cerne das preocupações administrativas dessas capitais, de modo algum esses projetos consistem em pretensões imaculadas, ou numa espécie de “novidade”. Belo Horizonte leva a cabo o que seriam as continuidades do projeto de revitalização iniciado entre os anos de 2005 e 2006, quando pontos monumentais do centro da cidade foram adequados a cartilhas arquitetônicas de vários centros urbanos europeus, além de ser um momento que posicionou a capital mineira na linha de frente dos empreendimentos sofisticados de controle e monitoramento, como vemos no que veio a ser chamado de Projeto Olho-Vivo. O ano de 2006 abriu vias de intenso escoamento automobilístico no sentido centro-norte de BH (uma conexão entre o centro e o aeroporto de Confins), enquanto recebia, em tapetes vermelhos, os delegados transnacionais do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), os mesmos investidores que aqueceram com bilhões essas intervenções urbanísticas. Ao mesmo tempo, a marcha popular que apregoava, pelo simples estar-na-rua, a renúncia a essas políticas de higienização que se desenvolviam na cidade, se deparou com a robusta muralha das tropas de choque da polícia, que não poupou o uso da violência física, a ordens de cassetetes e balaços de borracha, para a comodidade daqueles que bancam e assinam tanto a coerção quanto o extermínio em seus vários níveis.

Mas que tipo de projetos são esses? A Linha Verde somou um bolsão de centenas de famílias desalojadas, várias comunidades desmanteladas, além de dar à luz uma aberração típica de qualquer emaranhado urbano que se preze, bem como os rotineiros projetos modernizadores que neles se pretendem consumar – a mesma espécie de interesse que visa a, sempre que possível, assegurar a superexploração desmedida de qualquer recurso vivo existente: sim, estamos falando daquilo que já há muito tempo era um rio-esgoto a céu aberto e que, logo que recebeu seus tampões cínicos, se apresentou com o título requintado de Bulevar Arrudas (a exemplo da criatura que, por não mais poder se aparentar como apropriada num círculo qualquer, vestiu o uniforme impecável e se deixou feder por dentro… mas ainda foi ao baile). Também investiu-se emergencialmente em obras de recapeamento de avenidas principais do centro, principalmente aquelas que conduzem aos prédios que hospedaram as conferências do encontro de delegados do BID. As outras obras foram se arrastando no decorrer desses últimos anos, como se pôde ver por todo o hipercentro de BH: alargamento de calçadas, reformas de praças, recuperação de fachadas, delimitação de publicidades, denso investimento na ampliação dos contingentes da guarda municipal e da polícia militar – prontificadas, ambas, a operarem nas ruas. Como fica evidente, são obras que respondem a uma lógica que quer traduzir os espaços da cidade em espaços de passagem, consumo e distanciamento, em contrapartida às suas potencialidades de encontro e apropriação direta. Ou melhor: são planos de ação antes de tudo pensados entre grupos específicos da sociedade, que ocupam espaços unânimes de decisão e imposição de seus projetos.

2010 é ano de promessas. Não apenas aquelas típicas prospecções que os calendários da economia global a cada ano querem seguir; tampouco simplesmente um ano de euforias eleitoreiras – por mais que devamos reconhecer o quão impactante é esse fator no desenvolvimento dessas tramas. Existe um elemento devastador no que apontam as perspectivas dos “oficiais” para esse ano: um futuro bem específico está sendo, desde agora, gerido e montado por cima de vidas e mortes que em breve estarão soterradas no esquecimento, pois assim têm-se erguido, através de nossas histórias, os fundamentos mais gerais da sociabilidade contemporânea, bases manhosas da sociedade de mercado: não bastando simplesmente fabricar uma política do esquecimento, deve-se instituí-la mediante a aniquilação mesma da memória, quando já não se faz possível ocultá-la a qualquer preço.

Os projetos aos quais se pretende dar curso durante esse ano dão seguimento a um velho ditame colocado na ordem do dia, mesmo muito antes de 2006, quando o higienismo econômico em proporções megalomaníacas se apresentou sob a insígnia de “revitalização” e deliberadamente vai varrendo do centro urbano de BH parte considerável dos tipos ali indesejados – muito embora isso só tenha se tornado viável temporariamente, pelo fato de ser intrínseco à própria dinâmica coagulada das grandes cidades o acirramento da privação em escalas extremas, ao ponto de conduzir, forçosamente, um número acentuado de indivíduos às regiões do centro, quando regiões que continuam sendo, por tendência, os tensos pontos de acúmulo das contradições que recheiam a economia mercantil e suas ofertas.

O que salta aos olhos quando nos defrontamos com os significados práticos do Decreto de 09 de dezembro de 2009, é justamente a autoridade conferida a um documento que tem em vista agir diretamente contra liberdades já há muito tempo consolidadas – e falamos aqui, por enquanto, a respeito de questões meramente restritas ao plano do Direito. Decretar unilateralmente uma proibição implica, no fundamental, em tolher ao diálogo e descartar da consulta as devidas partes às quais cabe, de fato, definir a legitimidade, o interesse ou a coerência do veto. Tratar o espaço dito “público” como um bem cujos usos devem passar por decisões exclusivas dos regimentos do Estado ou dos interesses privados é, mais uma vez, autenticar publicamente o seqüestro do que ainda pode ser tido como espaço de encontro do comum, de trocas ainda possíveis. Confirmações que revelam um panorama maior: fato é que os tempos de hoje põem no bojo de suas questões uma inequívoca crise do comum, a que se segue sua substituição gradual pelas licenças do dinheiro e da presença dos mecanismos de repressão, tudo isso em favor da pacificação fabricada, de um esforço por fazer com que, no âmbito da aparência mais superficial, o conflito se omita de uma vez por todas. Tal concepção se norteia por pressupostos bem simples: haver gente se encontrando nas ruas representa, necessariamente, algo de muito nocivo para quem assina e se beneficia do confisco!

O confisco de que falamos não se dá apenas sobre um meio, mas, especialmente, sobre os princípios de legitimidade desse meio, algo que talvez deva ser pensado para além das simples discussões sobre os fundamentos democráticos do Público. Falamos de nossa livre circulação, das possibilidades de troca em lugares que são nossos e que podem nos servir a isso, e que, portanto, devem estar sob nossos cuidados. A praça não é da prefeitura, tampouco de qualquer órgão alheio que se valha. Em BH e várias outras bolhas urbanas, a faxina somente toma prosseguimento. Sua forma, como costuma ser, assume as dimensões claras da expropriação e da eliminação, com ênfase nos seus aspectos econômicos – quer dizer: que saia e vá para longe quem economicamente só gera preocupação e gastos; e que se abra acesso a uma classe-média renovada, capaz de re-agitar as tramóias da especulação em níveis imobiliários, turísticos ou mesmo territoriais.